segunda-feira, 6 de junho de 2016


Inovação para o ensino superior





O Brasil vive um momento de profundas transformações, e a bandeira da educação é a mais relevante. A falta de projetos efetivos, e o descaso de investimentos e práticas na educação, trazem para todos os brasileiros os reflexos destruidores de uma nação. Vejam as conseqüências efetivas de violência, problemas na saúde, desenvolvimento econômico e inovação.



O Brasil perde todos os anos posições importantes quando se fala em competitividade e inovação. Boa parte dos problemas está na vontade política, mas também na distância que as universidades de uma forma geral têm em relação ao processo inovador, e na construção de modalidades de ensino inovadoras para práticas mais concretas de desenvolvimento econômico para o país.
O Blog EXAME Brasil no Mundo conversou com Priscila Simões, gestora do Instituto Expertise, que organiza em parceria com as melhores universidades americanas, uma série de eventos para a preparação dos gestores das universidades brasileiras, e um dos grandes temas é a inovação no ensino superior. Com o crescente na demanda educacional brasileira, e principalmente na grande necessidade de mão de obra qualificada, as universidades brasileiras precisam de uma nova postura, principalmente em programas inovadores e conectados com o mercado.
Brasil no Mundo: Inovação é um tema ainda difícil ainda no Brasil. E quando falamos em educação, o tema tem um desafio maior. Como as universidades brasileiras hoje encaram a inovação e o ensino da mesma?
Priscila Simões: Existem pelo menos 3 facetas para analisarmos o tema da inovação em uma instituição de ensino. Podemos pensar a perspectiva da gestão da própria instituição, ou seja, as universidades têm uma estrutura de gestão inovadora? A segunda perspectiva diz respeito à inovação no processo de ensino-aprendizagem. Ou seja, estamos ensinando de forma inovadora, de forma a potencializar a aprendizagem dos alunos? Ou apenas transmitimos conteúdos a serem memorizados pelos estudantes? E finalmente temos que analisar também a formação de pessoas e profissionais inovadores. Ou seja, até que ponto as universidades estão conseguindo formar pessoas que irão inovar em seus campos de atuação?
Infelizmente podemos observar que nas três perspectivas as instituições de ensino superior no Brasil ainda têm um longo caminho a percorrer. A atuação do Instituto Expertise está voltada a capacitar líderes acadêmicos e professores no que se refere, principalmente, aos dois primeiros aspectos em relação à inovação. Acreditamos que ao ter universidades com uma gestão inovadora e também processos de ensino inovadores, o caminho estará pavimentado para a formação de profissionais inovadores.
Brasil no Mundo: O instituto suíço IMD divulgou o ranking de 2013 dos países mais competitivos, e o Brasil caiu mais algumas posições, de 46 para 51 em competitividade. Um reflexo claro de problemas de inovação, educação e formação de mão de obra qualificada. Como as universidades estão encarando o desafio de formar mão de obra qualificada? Que estratégias as mesmas estão utilizando?
Priscila Simões: A discussão sobre inovação no ensino ainda é muito recente no Brasil. Na Educação Básica, até pouco tempo atrás, estávamos ainda preocupados com os altos índices de analfabetismo. Depois passamos um bom tempo preocupados em ter escolas suficientes para a população em idade escolar. Conseguimos universalizar o ensino básico apenas na década passada. Isso tudo acaba tendo reflexo no ensino superior também. Nós tínhamos um ensino superior altamente elitizado, com índices ridículos de população universitária quando comparados com vários outros países. O ensino superior brasileiro começou um processo forte de expansão após a Lei de Diretrizes e Bases de 1996. Havia uma demanda reprimida enorme de pessoas que queriam uma formação universitária, mas não tinham acesso. Então no final da década de 90 e início dos anos 2000 nós ampliamos muito a quantidade de instituições, cursos e alunos matriculados. Estamos começando agora no ensino superior brasileiro um processo de massificação e, juntamente com ele, começando a discutir a qualidade dos cursos e instituições. Essa expansão no Brasil se deu principalmente pela iniciativa privada porque o modelo de universidade pública que temos é caríssimo e portanto inviável de ser expandido a ponto de atender a demanda necessária. A meu ver o MEC, com seu aparato regulatório, não está conseguindo induzir um processo de aumento de qualidade nas instituições de ensino superior. Precisaríamos ter mais flexibilidade e diversidade para atender as demandas em termos de formação de um país grande e diverso como o Brasil, mas o MEC induz a todos fazerem o mesmo da mesma forma. E freqüentemente as instituições de ensino ficam mais preocupadas em atender as demandas regulatórias impostas pelo Ministério da Educação do que em discutir efetivamente a qualidade de seus cursos, professores e dos profissionais que estão formando. Mas claro que isso não significa que não haja inovação. Existem experiências interessantes (tanto no setor público quanto no privado) em termos de inovação no currículo e também em processos de ensino e aprendizagem. Mas são exceções.
Brasil no Mundo: Este ano vocês estão organizando o segundo seminário de inovação no Ensino Superior, em parceria com o LASPAU de Harvard, que é um programa para fomentar a ida de estudantes e professores brasileiros para os Estados Unidos. Quais os objetivos do programa? Qual o público? E quais foram os resultados do programa anterior?
Priscila Simões: Nós não levamos estudantes. O programa é para líderes (reitores, mantenedores, pró-reitores, coordenadores de curso) e para professores. Queremos contribuir para a mudança das instituições de ensino superior para que elas também mudem seus estudantes para melhor. No ano passado, no 1º Seminário, levamos 41 gestores de diversas instituições de diferentes estados e cidades do Brasil. Foram cinco dias, com professores de Harvard e do MIT discutindo casos de sucesso, metodologias inovadoras, projetos institucionais, bastante focados nas questões de ensino e aprendizagem. Percebemos que havia uma demanda grande para a discussão da questão da inovação. Por isso fizemos este ano uma Conferência no Brasil, em março, em Salvador e trouxemos diversos professores americanos e também brasileiros. E agora estamos organizando o 2º Seminário de Inovação Acadêmica lá nos Estados Unidos, que acontecerá entre 11 e 15 de novembro.
Brasil no Mundo: Quais os temas do evento para este ano? E como as universidades devem interagir com o programa?
Priscila Simões: Este ano vamos ampliar as instituições estrangeiras que participarão do programa. Além da Universidade de Harvard e do MIT, também são parceiros do Seminário o Babson College e o Olin College. Então vamos discutir estratégias para inovar em sala de aula, metodologias inovadoras, mas o programa terá um foco grande também em empreendedorismo, que é uma faceta importantíssima em se tratando de inovação. Por isso passaremos 2 dias no Babson College, que é uma referência no mundo todo em empreendedorismo. Muitas universidades brasileiras acreditaram, equivocadamente, que bastaria colocar a disciplina “empreendedorismo” nos currículos dos seus cursos e, pronto, estariam formando empreendedores. Mas evidentemente isso não ocorreu. É preciso criar uma cultura empreendedora em toda a instituição de ensino. Mas como fazer isso? Esse é um dos pontos que iremos discutir no Seminário deste ano. Quanto ao Olin College, é uma referência mundial no ensino das Engenharias e na construção de currículos multidisciplinares. Já é consenso no Brasil que precisamos aumentar nosso número de engenheiros para poder competir com países como a China, Coréia, Índia e outros. Muitas instituições de ensino estão ampliando seus cursos de Engenharia. Então achamos que seria oportuno buscar boas referências nessa área também. A programação completa do seminário está no site www.institutoexpertise.org.br <http://www.institutoexpertise.org.br>
Brasil no Mundo: A consultoria Mckinsey publicou recentemente estudo sobre a distância entre universidades, empresas e alunos, e o Brasil tem os piores indicadores. Como vocês avaliam este quesito hoje? A integração não é fator fundamental para o processo de inovação?
Priscila Simões: Essa aproximação é importante para o desenvolvimento científico e tecnológico do país. É claro que as universidades não podem estar apenas a serviço das empresas, mas nós temos universidades muito apartadas do mundo produtivo mesmo. Me parece que para melhorar isso teria que haver um esforço das próprias universidades, mas também das indústrias e empresas. Outro agente muito importante aí é o Ministério da Educação, que poderia, juntamente com o Ministério de Ciência e Tecnologia, ajudar a criar pontes entre as empresas e as universidades. No entanto, ao analisar o arcabouço avaliativo e regulatório do MEC fica claro que não há um entendimento por parte do governo que essa aproximação também é sinônimo de qualidade. Os critérios de qualidade do MEC são muito “acadêmicos” para todos os tipos de curso, inclusive para aqueles que foram criados com uma vocação mais voltada ao mundo profissional, como é o caso da graduação tecnológica.
Brasil no Mundo: Quais os grandes desafios e próximos projetos do Instituto Expertise?
Priscila Simões: O Instituto Expertise é uma instituição sem fins lucrativos criada com a missão de contribuir para a melhoria da educação no Brasil. Seu objetivo é disseminar novas metodologias de ensino-aprendizagem e de gestão educacional, capacitando gestores educacionais e professores. Para isso, busca multiplicar e difundir conhecimento, inovação e as melhores práticas pedagógicas e de gestão existentes no mundo. Somos parceiros da Laspau, organização filiada à Universidade de Harvard, que organiza e promove programas acadêmicos e profissionais para as Américas. Para poder cumprir com nossa missão, pretendemos organizar outra Conferência no Brasil em março de 2014, pois sabemos que poucas pessoas conseguem ir para outros países nos programas que realizamos lá. Estamos buscando formas de ampliar nossa atuação para o maior número de pessoas possíveis. Na Conferência em Salvador, em março deste ano, participaram 300 pessoas, de 100 universidades, de 19 Estados diferentes do Brasil. Nosso sonho é contaminar todo o país com o vírus da inovação na educação.
Priscila Simões – Doutora em Educomunicação pela USP; mestre em Mídia e Comunicação pela University of London; bacharel em Jornalismo pela PUC-SP. Possui formação executiva pela Fundação Dom Cabral e Kellogg School of Management. Foi reitora de instituição de ensino superior. Atualmente é diretora do Instituto Expertise, consultora em gestão educacional e professora em MBA de Gestão Universitária.

http://exame.abril.com.br/rede-de-blogs/brasil-no-mundo/2013/07/03/inovacao-para-o-ensino-superior/

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