segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018


Vale do silício e a educação


Alguns já devem ter ouvido falar no termo peer-to-peer (entre pares), ou P2P. É o conceito de descentralização, que hoje é aplicado por exemplo na moeda virtual Bitcoin ou em downloads de torrent (em que usuários compartilham entre si pedaços de arquivos)


Isso quer dizer que cada um dos indivíduos detém parte da informação, estes se juntam para que todos tenham acesso a essas informações. Dessa forma, quanto mais pessoas participando da rede mais sólida e confiável ela é. Aplicado este conceito à educação, a 42 é uma instituição sem professores, horário de aula ou divisão de turma, em que os alunos deixam de ser apenas observadores e tornam-se criadores do próprio conhecimento. 





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Tudo acontece em um grande laboratório sem paredes, que funciona 24 horas por dia, em todos os dias do ano, permitindo que os alunos escolham quando irão estudar.

A base curricular é extensa e os alunos participam da sua criação.

Essa, permite a atuação em três áreas da computação: programas e sistemas, algoritmos e IA ou gráficos e imagem.

Os alunos possuem total liberdade para escolher qual (ou quais) áreas deseja se aprofundar, e então, o estudante recebe projetos cada vez mais complexos para completar seu currículo.

A duração do curso também depende unicamente do aluno, porém tem um tempo médio de três a cinco anos.


Não existem trabalhos, atividades de casa ou provas na grade curricular da 42. 

Os alunos desenvolvem projetos predefinidos pela escola e à medida que entregam, avançam no currículo gamificado, que vai do nível zero a 21. 

Existe um conteúdo comum nos primeiros níveis, mas em pouco tempo o aluno vai aprofundando na(s) área (s) que escolheu.

Eram cerca de 200 alunos em um curso intensivo de programação, estudando dez horas por dia durante quatro semanas ininterruptas. 

Todos os dias recebíamos um conjunto de dez a 20 exercícios na linguagem de programação C, para serem entregues no dia seguinte com 36 horas de prazo. 

A entrega dos trabalhos era individual, mas era permitido discutir e realizar os exercícios em grupo – o que aconteceu naturalmente.

Junto aos vários quadros brancos disponíveis pelo laboratório, sempre era possível encontrar um grupo de alunos explicando exercícios uns aos outros enquanto desenhavam o raciocínio e desenvolviam os trabalhos. 


Era uma espécie de sala de aula espontânea, com alguns explicando conceitos e outros discutindo a aplicação e maneiras de otimizar.


Escola 42 no Vale do Silício, EUA



Nenhum conteúdo ou referência é fornecido pelo material do exercício, tão pouco pelos funcionários da escola. 

A opção era recorrer a conteúdos online ou aos colegas. 

Não ter um professor/orientador no começo é difícil, mas sua ausência acabou deixando de ter tanta importância e levou ao desenvolvimento de uma outra grande habilidade: aprender a aprender. 

Parece confuso, mas a 42 utiliza uma metodologia diferenciada e possui prazos apertados, os alunos têm que se acostumar adquirir um grande volume de conhecimento em pouco tempo. Não se trata apenas de conseguir fazer os exercícios, mas também entender o que foi feito, seus conceitos e aplicações.

Ao finalizar as atividades, é definido pelo sistema um horário para correção, tarefa também realizada pelos alunos. Isso faz com que praticamente todos se conheçam e interajam entre si pelo menos uma vez. 


São duas ou três correções para cada lista de atividades, e a nota final é a média delas. Na correção, os alunos discutem o que foi feito, esclarecem dúvidas e testam o resultado, o que torna esse momento também muito prazeroso.

Além de promover uma maior interação, esse modelo de correção também permite que cópias ou trapaças sejam identificadas, pois a lógica da resposta deve ser explicada e, caso ache a explicação insuficiente, o aluno corretor zera a nota da atividade. 


Ao finalizar a tarefa, o corretor também é avaliado e recebe um feedback (retorno avaliativo). Com isso, todos se esforçam para fazer uma correção aprofundada e ter bom relacionamento com os demais.

O método de correção varia de acordo com a dificuldade, ou seja, você deve acertar o exercício mais fácil para ser pontuado naquele com maior dificuldade. 


Isso é justificado pela distribuição das atividades, pois começa com uma tarefa simples, que aumenta gradualmente em complexidade. 

Um exemplo: criar uma lista, permitir que mais elementos sejam adicionados a ela, classificar em ordem alfabética e mostrar o resultado. Cada passo deste é um exercício precisa do anterior para ser feito. Caso o aluno falhe em um exercício, teoricamente não possui conhecimento suficiente para realizar os outros. Para reforçar o aprendizado, as atividades e conceitos se repetem ao longo do curso.

O ensino descentralizado exige muito mais do aluno, pois além de ter a dificuldade de conteúdo do tradicional, o estudante deve ter maior autocontrole, pois não existe horário ou matéria certa para estudar.


Comparado com o ensino tradicional, o peer-to-peer empodera o aluno, faz com que ele se esforce para aprender e constrói um conhecimento mais sólido e fundamentado. 

Além disso, a necessidade de se adaptar a diferentes situações e interagir com os demais desenvolve habilidades importantes para o mercado de trabalho.

Isso tudo sem comprometer aqueles que gostam da figura do professor, alguém que esclarece dúvidas e possui conhecimento sobre o assunto. 

Esse papel é exercido por algum outro aluno ou até mentor, que auxilia os demais sem o status de autoridade detentora de conhecimento.


Existem ainda alguns empecilhos na aplicação em larga escala dessa metodologia. 

A área de computação e engenharia talvez seja o ambiente mais fácil de disseminar, já cursos teóricos precisarão adaptar à metodologia. 

Outro ponto é a maturidade do aluno, que migra de um sistema completamente fechado e cheio de regras para um sem praticamente nenhuma restrição. 

Muitos não conseguem se controlar e não se dedicam o suficiente, ou acabam se frustrando e têm dificuldade de readaptar.












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